sexta-feira, outubro 31, 2008

Lendo Llansol - sobre cartas

"Como eu gostaria de saber em que circunstâncias terminarei
esta carta
se as cartas já não têm o valor de outrora, como cartas,
e ainda não atingiram o valor futuro, que hão-de ter e se,
no momento intermédio da passagem,
são autênticos invisíveis,
que perguntas continuarei eu a enviar-te
como quem espera por um alimento desconhecido,
e tem necessidade de o fazer como quem come?"

(fragmento de "Oferenda a Apollinaire______" in Mais Novembro Do Que Setembro, de Guilhaume Apollinaire. Tradução e Prefácio de Maria Gabriela Llansol. Lisboa: Relógio d'Água, 2001, p. 14)

sexta-feira, outubro 24, 2008

Chegada

Voltei, após quase três meses de ausência. Preparei aos poucos meu corpo e o meu espírito para o regresso. Dói deixar os que amamos. Fui me despedindo aos poucos: primeiro da filha e da neta - as duas de uma só vez, no mesmo dia. Na véspera da viagem, abracei comovidamente minha mãe, e deixei a vila onde nasci. Por fim, já no aeroporto, apertei fortemente o meu filho. Lágrimas inevitáveis. As da separação da netinha, estas foram disfarçadas. Choramos só quando entramos no carro, para que ela não visse que sofríamos.

O corpo ainda não se adaptou ao fuso horário. O espírito estranhou um pouco as ruas, as gentes, a casa e os objetos que deveriam ser familiares.

No primeiro dia após o regresso, logo de manhã, vi que o meu neto do coração cresceu bastante e já fala muitas palavras novas. Não me esqueceu! Assim que percebeu que voltamos, antes de ir para a escola, fez questão de visitar-nos e passar umas horas com a titia.

Muito à vontade, pediu para ver desenhos animados, aninhado na nossa cama. Depois veio brincar com os carrinhos dele, enquanto eu limpava algumas prateleiras do armário da cozinha. De tarde, quando regressou da creche, chamou-me para brincar na fresta da varanda. Expliquei-lhe que estava muito suja e suada e que precisava tomar um banho. Ele entendeu.

Ainda não pude ver o mar que tanto amo. Pretendo vê-lo hoje à tardinha, quando formos dar a habitual caminhada. Depois eu conto como foi esse reencontro.

quarta-feira, outubro 22, 2008

A gramática das crianças

_ Madrinha, o que é isso?
_ É uma borracha. Serve para apagar o que a gente escreve.
_ Posso usar?
_ Claro que sim, pérola da minha vida.

[cerca de cinco minutos depois entra na sala a querida tia-avó]

_ Então, meu amor? O que é que você está fazendo?
_ Estou a "borrachar".