Talvez não haja dias da nossa infância tão plenamente vividos como os que julgámos ter deixado de viver, os que passámos com um livro preferido.
Marcel Proust
Um blogue escrito por três pares de mãos separados por águas atlânticas. Uma viagem com escalas no Rio de Janeiro, em Londres e Senhora da Hora.
domingo, julho 24, 2005
domingo, julho 17, 2005
Má Educação
A ordinarice e a má educação só ofendem verdadeiramente os seus autores, não os seus destinatários."
MST (in PÚBLICO, 17/6/05)
MST (in PÚBLICO, 17/6/05)
sábado, maio 21, 2005
Da Letónia à Irlanda em busca de sonho
No início de Fevereiro de 2005, um homem troca a Letónia pela Irlanda. Não tem qualquer proposta de emprego ou contacto privilegiado no país de James Joyce. Chama-se Aleksandrs Aleksjevs e aparenta ter cerca de 60 anos. Na sua aldeia natal, o letão deixou a família e uma colecção de mais de 200 pássaros exóticos. Conhecemo-lo numa noite excepcionalmente fria, nas mesas de convívio do Hostel Isaac, no centro de Dublin. Está rodeado de jovens dos mais diferentes países, mas parece só. Toma pausadamente um chá fumegante e come torradas com geleia de morango (será só isso o seu jantar?). Olha-nos como se quisesse encetar uma conversa, mas, como descobriremos algum tempo mais tarde, fala inglês com muita dificuldade. Oferece-se para lavar a nossa louça. E põe à nossa frente fotos de pássaros. Primeiro, uma avestruz. Depois, um cisne preto australiano, uma pomba real... Sobejam gestos e imagens, escasseiam as palavras para responder com precisão às nossas perguntas. Sempre que necessário, recorre ao tradutor electrónico que, num passe de mágica, transforma os caracteres do cirílico em palavras inglesas. E assim vamos nos entendendo, partilhando a história da sua vida. Descobrimos que trabalhou ao longo de 30 anos no mar, a bordo de embarcações petrolíferas, mas que já não consegue laborar sobre as ondas. Correu mundo na companhia do fio azul que aparta o céu do oceano. Mas agora está "cansado". Quer realizar o seu sonho: dedicar-se às aves exóticas. A recente entrada de mais dez países – entre eles a Letónia – para o clube europeu garantiu-lhe um passaporte. Tem três meses para encontrar o emprego desejado e, assim, ganhar em euros. Já se passaram quinze dias. Até agora, nada. O zoológico da cidade não precisa de colaboradores. Criadores de aves ainda não deram resposta. Deixou-lhes o seu contacto telefónico. Aleksandrs não desiste. Faz-nos lembrar Walter Dias, a personagem trota-mundos de "O Vale da Paixão", romance de Lídia Jorge. Walter é não só um viajante incorrigível, mas também um homem apaixonado por aves. "Desenhava pássaros para os seus sobrinhos pequenos verem, através do planisfério, como eram a fauna e a flora do mundo que ele conhecia. Ele [...] Às vezes eram desenhos rápidos que ilustravam apenas as espécies e os lugares onde os pássaros viviam, mas outras vezes os desenhos dele animavam-se de intenções, e da expressão dos animais desprendiam-se sentimentos como se tivessem alma." Aleksandrs não desenha pássaros. Prefere alimentá-los, estudar os seus hábitos e fotografá-los. Nos dias subsequentes, vimo-lo a mostrar as mesmas imagens para outros hóspedes. Era como se enviasse uma mensagem numa garrafa, um pedido de socorro. Como se quisesse encontrar nas pessoas algum vestígio de pertença, arrancar dos seus rostos a confirmação de que a quimera é possível. Após a partida de Dublin, não mantivemos contacto com Aleksandrs. Mas preferimos acreditar que sim, que é possível, que neste preciso instante o telemóvel prateado estará a tocar.
domingo, abril 17, 2005
A beleza pode estar no insondável
"Onde não há jardins, as flores nascem de secreto investimento em formas improváveis."
Carlos Drummond de Andrade
Carlos Drummond de Andrade
segunda-feira, abril 04, 2005
Centro Português de Fotografia
Há uma foto perturbadora na nova exposição do Centro Português de Fotografia, inaugurada no passado dia 2 de Abril, no Porto. Chama-se "Desvanescendo" ("Fading Away", 1858, talvez a sua mais famosa imagem) e é de autoria do fotógrafo Henry Peach Robinson (1830-1901). Considerado um dos pioneiros da fotografia pictória e grande admirador das telas de Turner, Robinson consegue reunir numa única cena os delicados sentimentos provocados pela doença numa família. Uma rapariga padece de tuberculose e, à sua volta, os pais e a irmã desesperam. O pai volta costas, como se não quisesse aceitar a finitude humana. O céu está prestes a rebentar, um prenúncio de tempestade que não retira serenidade (nem pesar) ao rosto da mãe e da irmã da menina.

A imagem provocou grande polémica na altura. Muitos críticos alegaram que a cena era demasiado dolorosa para ser registada. Poderia, é claro, ser pintada. Mas nunca registada. Contudo, a fotografia acabou por seduzir o Prince Albert, que não só comprou uma´reprodução, como também manifestou o desejo de adquirir uma cópia de todas as composições que Robinson fizesse posteriormente.
"Fading Away" resulta da junção de cinco negativos, algo que também incomodava profundamente os defensores da ciência fotográfica. Robert Legat escreve o seguinte sobre esse episódio:
"Already at this period there were shades of the conflict between the art and science of photography. The Secretary of the Society and Editor of the Journal, Sir William Crookes, is quoted in Robinson's autobiography: "The secretary at that time was an unsympathetic chemist and all he could see in the picture in what he thought was a ''join,' an imaginary enormity which afforded a text on which he waxed eloquent." It is clear that many who admired "Fading Away" had no idea that it was a combination print and when, in 1860, Robinson outlined his methods at a meeting of the Photographic Society of Scotland, he was greeted with howls of protest from people who seemed to feel that they had been deceived. There was much discussion about what one correspondent referred to as "Patchwork", rather than composition, and Robinson began to conclude that perhaps it might be better in future not to divulge the secrets of his craft, but leave people to enjoy the finished product!
However, in "Pictorial Effect in Photography" (1867), a major literary work, Robinson wrote: "Any dodge, trick and conjuration of any kind is open to the photographer's use.... It is his imperative duty to avoid the mean, the base and the ugly, and to aim to elevate his subject.... and to correct the unpicturesque....A great deal can be done and very beautiful pictures made, by a mixture of the real and the artificial in a picture."
At a time when the Photographic Society seemed unduly obsessed with the scientific aspects of photography, Robinson was stressing the need to "see" a picture - advice which still holds good today: "However much a man might love beautiful scenery, his love for it would be greatly enhanced if he looked at it with the eye of an artist, and knew why it was beautiful. A new world is open to him who has learnt to distinguish and feel the effect of the beautiful and subtle harmonies that nature presents in all her varied aspects. Men usually see little of what is before their eyes unless they are trained to use them in a special manner." Some of his observations make sound advice today. Here is a comment on "rules" of composition: "I must warn you against a too close study of art to the exclusion of nature and the suppression of original thought.... Art rules should be a guide only to the study of nature, and not a set of fetters to confine the ideas or to depress the faculty of original interpretation in the artist, whether he be painter or photographer.... The object (of rules) is to train his mind so that he may select with ease, and, when he does select, know why one aspect of a subject is better than another."
"Fading Away", exposta na magnífica cela das mulheres do CPF, já justifica uma visita (grátis!) à mostra "Experimentação na Colecção de Fotografia do IVAM".
A imagem provocou grande polémica na altura. Muitos críticos alegaram que a cena era demasiado dolorosa para ser registada. Poderia, é claro, ser pintada. Mas nunca registada. Contudo, a fotografia acabou por seduzir o Prince Albert, que não só comprou uma´reprodução, como também manifestou o desejo de adquirir uma cópia de todas as composições que Robinson fizesse posteriormente.
"Fading Away" resulta da junção de cinco negativos, algo que também incomodava profundamente os defensores da ciência fotográfica. Robert Legat escreve o seguinte sobre esse episódio:
"Already at this period there were shades of the conflict between the art and science of photography. The Secretary of the Society and Editor of the Journal, Sir William Crookes, is quoted in Robinson's autobiography: "The secretary at that time was an unsympathetic chemist and all he could see in the picture in what he thought was a ''join,' an imaginary enormity which afforded a text on which he waxed eloquent." It is clear that many who admired "Fading Away" had no idea that it was a combination print and when, in 1860, Robinson outlined his methods at a meeting of the Photographic Society of Scotland, he was greeted with howls of protest from people who seemed to feel that they had been deceived. There was much discussion about what one correspondent referred to as "Patchwork", rather than composition, and Robinson began to conclude that perhaps it might be better in future not to divulge the secrets of his craft, but leave people to enjoy the finished product!
However, in "Pictorial Effect in Photography" (1867), a major literary work, Robinson wrote: "Any dodge, trick and conjuration of any kind is open to the photographer's use.... It is his imperative duty to avoid the mean, the base and the ugly, and to aim to elevate his subject.... and to correct the unpicturesque....A great deal can be done and very beautiful pictures made, by a mixture of the real and the artificial in a picture."
At a time when the Photographic Society seemed unduly obsessed with the scientific aspects of photography, Robinson was stressing the need to "see" a picture - advice which still holds good today: "However much a man might love beautiful scenery, his love for it would be greatly enhanced if he looked at it with the eye of an artist, and knew why it was beautiful. A new world is open to him who has learnt to distinguish and feel the effect of the beautiful and subtle harmonies that nature presents in all her varied aspects. Men usually see little of what is before their eyes unless they are trained to use them in a special manner." Some of his observations make sound advice today. Here is a comment on "rules" of composition: "I must warn you against a too close study of art to the exclusion of nature and the suppression of original thought.... Art rules should be a guide only to the study of nature, and not a set of fetters to confine the ideas or to depress the faculty of original interpretation in the artist, whether he be painter or photographer.... The object (of rules) is to train his mind so that he may select with ease, and, when he does select, know why one aspect of a subject is better than another."
"Fading Away", exposta na magnífica cela das mulheres do CPF, já justifica uma visita (grátis!) à mostra "Experimentação na Colecção de Fotografia do IVAM".
segunda-feira, março 14, 2005
A dor
"E aos poucos fui começando a juntar a minha bagagem no quarto. Esta foi uma operação reluzentemente bonita que trouxe ansiedade. Parecia-se bastante com as ondas. Onde quer que eu estivesse nesta operação - de uma separação inevitável mas natural e de algum modo triste -, quando de repente parava, era um sentimento doloroso, como uma palpitação, mais do que um sentimento de amargura, que se aproximava ininterruptamente no interior do meu coração eu sabia-o."
"Adeus Tsugumi", de Banana Yoshimoto (Cavalo de Ferro, 2004)
"Adeus Tsugumi", de Banana Yoshimoto (Cavalo de Ferro, 2004)
quarta-feira, fevereiro 23, 2005
Sobre a prosperidade
"Abomine a avareza
Humanize a riqueza
Ignore o modismo
Se liberte do consumismo"
Se assim for, a prosperidade pode ser um instrumento de felicidade.
Os versos acima pertencem a Martinho da Vila, uma espécie de visita amável que fez recentemente à cantora brasileira Fernanda Abreu. Para ouvir na canção "Patroeira Debochada", no novo disco da ex-blitz Fernandinha.
Humanize a riqueza
Ignore o modismo
Se liberte do consumismo"
Se assim for, a prosperidade pode ser um instrumento de felicidade.
Os versos acima pertencem a Martinho da Vila, uma espécie de visita amável que fez recentemente à cantora brasileira Fernanda Abreu. Para ouvir na canção "Patroeira Debochada", no novo disco da ex-blitz Fernandinha.
domingo, janeiro 23, 2005
Austerlitz
"Os viajantes solitários que passam dias inteiros num silêncio ininterrupto normalmente agradecem quando lhes dirigem a palavra."
"Austerlitz", de W.G. Sebald, (Teorema, 2004, p.9)
"Austerlitz", de W.G. Sebald, (Teorema, 2004, p.9)
sexta-feira, outubro 15, 2004
Ainda Jacques Derrida
Mais uma tradução de Pedro Eiras, em homenagem ao filósofo francês:
"Porque, de cada vez, e de cada vez singularmente, de cada vez insubstituivelmente, de cada vez infinitamente, a morte não é nada menos do que um fim do mundo. Não só um fim entre outros, não o fim de alguém ou de algo no mundo, não o fim de uma vida ou de um vivo. A morte não põe um termo a alguém no mundo, nem a um mundo entre outros, a morte marca de cada vez, e de cada vez contra a aritmética, o fim absoluto do único e mesmo mundo, daquilo que cada um abre como um único e mesmo mundo, o fim do único mundo, o fim da totalidade daquilo que é ou pode apresentar-se como a origem do mundo para um certo vivo, um único vivo, humano ou não.
Então, o sobrevivente fica sozinho. Além do mundo do outro, ele fica ainda de algum modo além ou aquém do próprio mundo. No mundo fora do mundo e privado do mundo. Sente-se pelo menos como o único responsável, chamado a transportar em si o outro e o seu mundo, o outro e o mundo desaparecidos, responsável sem mundo (weltlos), sem o solo de qualquer mundo, doravante, num mundo sem mundo, como sem terra mais além do que o fim do mundo."
Béliers. Le dialogue ininterrompu :
entre deux infinis, le poème (2003), p. 23
"Porque, de cada vez, e de cada vez singularmente, de cada vez insubstituivelmente, de cada vez infinitamente, a morte não é nada menos do que um fim do mundo. Não só um fim entre outros, não o fim de alguém ou de algo no mundo, não o fim de uma vida ou de um vivo. A morte não põe um termo a alguém no mundo, nem a um mundo entre outros, a morte marca de cada vez, e de cada vez contra a aritmética, o fim absoluto do único e mesmo mundo, daquilo que cada um abre como um único e mesmo mundo, o fim do único mundo, o fim da totalidade daquilo que é ou pode apresentar-se como a origem do mundo para um certo vivo, um único vivo, humano ou não.
Então, o sobrevivente fica sozinho. Além do mundo do outro, ele fica ainda de algum modo além ou aquém do próprio mundo. No mundo fora do mundo e privado do mundo. Sente-se pelo menos como o único responsável, chamado a transportar em si o outro e o seu mundo, o outro e o mundo desaparecidos, responsável sem mundo (weltlos), sem o solo de qualquer mundo, doravante, num mundo sem mundo, como sem terra mais além do que o fim do mundo."
Béliers. Le dialogue ininterrompu :
entre deux infinis, le poème (2003), p. 23
quinta-feira, outubro 14, 2004
Fim da picada
Há um deputado brasileiro (e evangélico) que acredita que o Estado deve investir... na "cura" dos homossexuais! A criatura chama-se Edino Fonseca e, ao que parece, deve sofrer de autismo. Como é que um país como o Brasil, cujo sistema público de saúde está a estourar pelas costuras, pode se dar ao luxo de "tratar" algo que, de resto, não é uma doença? Edino Fonseca deveria, isso sim, ser deportado directamente para a Quinta das Celebridades.
Cartas de Mariana Blanc
A brasileira Mariana Blanc criou um blog com textos antigos, uma espécie de gaveta virtual dos seus apontamentos e contos. É muito curioso, sobretudo para quem conhece a verve desta menina que, sem sombra de dúvida, herdou a poesia do velho Aldir Blanc.
quarta-feira, outubro 13, 2004
Fernando Sabino virou menino
O mundo das palavras sofreu ontem mais uma perda. Fernando Sabino, escritor brasileiro, pede para que escrevam na sua lápide: "nasci homem, morri menino". Recebo a notícia através de uma amiga, que me envia o seguinte texto:
"Hoje Fernando Sabino reinaugura os céus. Assim mesmo - no plural - porque será preciso mais de um para dar conta de sua alegria macunaímica. Leva corpo e alma de menino, como queria, alastrando a inevitável juventude.
Quando os ventos uivarem um canto mais claro, quando a lua alumbrar sem piedade, quando uma estrela driblar o brilho do dia, a certeza: coisa de Fernando em festejo de presença. A partir de hoje, a graça dos céus será dele."
"Hoje Fernando Sabino reinaugura os céus. Assim mesmo - no plural - porque será preciso mais de um para dar conta de sua alegria macunaímica. Leva corpo e alma de menino, como queria, alastrando a inevitável juventude.
Quando os ventos uivarem um canto mais claro, quando a lua alumbrar sem piedade, quando uma estrela driblar o brilho do dia, a certeza: coisa de Fernando em festejo de presença. A partir de hoje, a graça dos céus será dele."
sábado, outubro 09, 2004
Jacques Derrida despede-se aos 74 anos
"Atrás de um romance, ou de um poema, atrás daquilo que é com efeito a riqueza de um sentido a interpretar, não há que procurar um sentido secreto. O segredo de uma personagem, por exemplo, não existe, ela não tem qualquer espessura fora do fenómeno literário. Tudo é secreto na literatura e não existe qualquer segredo escondido atrás dela"
Entrevista do filósofo francês a Antoine Stire, em 2000, publicada na obra "Papier Machine" (2001). Excerto escolhido e traduzido pelo escritor Pedro Eiras (com a sua habitual sensibilidade).
quinta-feira, outubro 07, 2004
EU AMO
Eu amo o teu gravador de chamadas.
Ele não me abandona
e repete vezes sem conta
a tua voz.
Pedro Mexia in "Avalanche (Quasi, 2001)
Ele não me abandona
e repete vezes sem conta
a tua voz.
Pedro Mexia in "Avalanche (Quasi, 2001)
Os acordes do lixo
Tinha que ser no Brasil. A criatividade própria das favelas deu origem, mais uma vez, a uma orquestra feita inteiramente de lixo. O projecto chama-se "Reciclagem, Misancene e Música" e tem sido desenvolvido na comunidade Mangueiral, em Realengo, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Canos de PVC, caricas, caixinhas de doces, cascas de árvores e até campainhas de telefones velhos dão origem a instrumentos musicais. Dessa forma, os jovens aprendem a fazer música e a produzir as suas próprias ferramentas de trabalho. Leia mais sobre a iniciativa aqui.
terça-feira, outubro 05, 2004
O perfume e a curiosidade
Há mais de 200 anos, o físico alemão Christof Lichtenberg escreveu no seu diário:
"To invent an infallible remedy against toothache, which would take it away in a moment, might be as valuable and more than to discover a new planet... but I do not know how to start the diary of this year with a more important topic than the news of the new planet".
O cientista queria dizer que a descoberta do planeta Urano, em 1781, era algo importantíssimo para o conhecimento do mundo, independentemente de ter ou não uma utilidade prática. Curiosidade, em síntese.
Foi divulgada, ontem, a atribuição do Prémio Nobel da Medicina 2004 aos investigadores Richard Axel e Linda Buck, ambos norte-americanos. A dupla estudou milhares de genes envolvidos no olfato. Estavam movidos pela curiosidade, embora admitam agora que os seus estudos, publicados em 1991, possam vir a ser úteis no tratamento de pessoas sem olfato. Descobriu-se assim que podemos armazenas numa base de dados cerca de dez mil cheiros, sendo certo que muitos deles nos fazem lembrar o homem amado ou uma fatia da infância.
"To invent an infallible remedy against toothache, which would take it away in a moment, might be as valuable and more than to discover a new planet... but I do not know how to start the diary of this year with a more important topic than the news of the new planet".
O cientista queria dizer que a descoberta do planeta Urano, em 1781, era algo importantíssimo para o conhecimento do mundo, independentemente de ter ou não uma utilidade prática. Curiosidade, em síntese.
Foi divulgada, ontem, a atribuição do Prémio Nobel da Medicina 2004 aos investigadores Richard Axel e Linda Buck, ambos norte-americanos. A dupla estudou milhares de genes envolvidos no olfato. Estavam movidos pela curiosidade, embora admitam agora que os seus estudos, publicados em 1991, possam vir a ser úteis no tratamento de pessoas sem olfato. Descobriu-se assim que podemos armazenas numa base de dados cerca de dez mil cheiros, sendo certo que muitos deles nos fazem lembrar o homem amado ou uma fatia da infância.
Só mesmo no Brasil
O jornalista Marcelo Camacho teve a ideia de reunir em livro 1001 razões para gostar do Brasil. A editora brasileira sextante publicou esta lista afectiva num volume de bolso. A leitura é deliciosa. Seguem alguns exemplos.
1) Tratar garçons de um restaurante pelo nome
2) João Gilberto cantando "Chega de Saudade"
3) Tratar todo mundo por "você" e "senhor", mesmo que seja o presidente da República
4) O bico do tucano
5) Rapadura
6) Ouvir dizer que Deus é brasileiro
7) Os romances policiais de Rubem Fonseca
1) Tratar garçons de um restaurante pelo nome
2) João Gilberto cantando "Chega de Saudade"
3) Tratar todo mundo por "você" e "senhor", mesmo que seja o presidente da República
4) O bico do tucano
5) Rapadura
6) Ouvir dizer que Deus é brasileiro
7) Os romances policiais de Rubem Fonseca
domingo, setembro 26, 2004
terça-feira, julho 27, 2004
Esperar por Borges
"Lembro-me de ter encontrado, há já muitos anos, Jorge Luís Borges. Na porta da sua casa, na rua Maipú, uma pequena placa e cobre: "Borges". La mucama, a governanta que, tenho quase a certeza, se chamava Fanny, como a avó inglesa, abriu-me a porta e conduziu-me ao salão. Ele estava ao fundo, sentado num sofá, com as mãos apoiadas na bengala, a conversar com um indivíduo. Ao longo a parede, sentados em cadeiras, outros esperavam a sua vez: um pretendia o seu patronato para um centro cultural de bairro, outro uma dedicatória, e por aí fora. Qualquer pessoa tinha acesso à casa dele, e mais tarde até me contaram que turistas americanos chegaram ao ponto de se fotografarem ao lado dele. Dir-se-ia a sala de espera de um dentista, embora no dentista não se assista aos tormentos do cliente que nos precede. Fiquei horrorizado. Não tinha qualquer pergunta para lhe fazer."
Este é um excerto do livrinho "Paisagens Originais", de Olivier Rolin (o mesmo de "Porto Sudão"; "A Invenção do Mundo", "O Meu Chapéu Cinzento" e o recente "Tigre de Papel") , editado entre nós pela Asa. Faz parte daquela colecção "Pequenos Prazeres", que, neste momento, está a ser vendida por preços entre os 1, 5 e os 3,5 euros em hipermercados. Nesta obra deliciosa, que se lê em apenas uma ou duas horas, Rolin traça breves perfis de cinco homens memoráveis: Hemingway e Nabokov, por exemplo. Há ainda reproduções de fotos destes autores quando crianças. Vale a pena. Vale muito a pena.
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