A avó da menininha escreveu um livro sobre Literatura Infantil, dedicando-o em especial à pequena netinha.
Logo que recebeu as provas finais, feliz com a bela capa e por ver o trabalho pronto, resolveu enviá-lo aos filhos e à neta, que residem do outro lado do cais.
Entusiasmada, a filha, tia-madrinha da menininha, pôs no colo a destinatária privilegiada do livro, apreciando com ela os detalhes da capa ( - Vamos ver que bichinhos estão desenhados?) e lendo-lhe a dedicatória que a avó escreveu:
- Dedicado em especial à pequena * (e a quem mais chegar....)
A menininha olhava e ouvia tudo atentamente. enquanto, com o seu jeitinho característico, torcia com as duas mãozinhas as pontas da camiseta.
De repente, comentou:
- Eu não sou pequena!
Ao saber dessa história através da filha, a avó pensou:
- Claro, tem razão, meu amor... você não é pequena, se comparada com os bebês da turma dos pequenos da sua creche (com certeza você ouviu as professoras referindo-se assim a eles e, por isso, fez essa comparação), mas é pequenina para os seus avós que tanto te amam, e era ainda menor, um bebezinho, quando a vovó começou a redigir os primeiros textos do livro que dedicou a você...
Um blogue escrito por três pares de mãos separados por águas atlânticas. Uma viagem com escalas no Rio de Janeiro, em Londres e Senhora da Hora.
sexta-feira, fevereiro 29, 2008
Um novo cais
O nosso Toni agora tem mais cais. Vale a pena visitar. Chama-se Sede de Rede.
Há uma parte que diz assim: "E é no cais que encontro lugares que nunca vi, pessoas que julgava não ter a oportunidade de conhecer. O cais é o porto de encontro, mas é só o início, só o início."
quarta-feira, fevereiro 13, 2008
A avó e os netos do coração
Todos os dias, quando chega da creche, o bebê corre à fresta que separa a sua varanda da do apartamento vizinho, e chama:
- Titi! Titi!
Titi, para ele, é o nome da vizinha. E ela prontamente responde:
- Uh!
- Uh! - repete o menininho.
- A titia está aqui, meu amor!
Ambos trocam pequenos objetos pelos buracos da rede protetora. De vez em quando, a titi precisa se ausentar, mas antes explica para o menininho:
- A titia vai tomar banho e depois vai caminhar com o titio, está bem? Tchau, até logo, meu amor!
Quando retorna, espanta-se com a série de carros e bonequinhos que o bebê conseguiu passar para a sua varanda. Sempre atento, ele logo percebe quando há alguém do outro lado. E começa tudo outra vez:
- Titi!
-Uh! Estou aqui!
A titia não sabe direito como esse caso de amor começou. Lembra-se que a irmã do menininho, quando era bebê, também gostava de interagir com ela através da varanda, mas de modo diferente, admirando-se de vê-la no reflexo do vidro espelhado. O fato é que, não importa a maneira, os pequeninos conseguem perceber o quanto ela gosta de crianças. E ela ama muito esse neto do coração, assim como ama a netinha que vive longe (a menininha das histórias deste blog). E, com certeza, será imenso o afeto que sentirá (já sente) pelo outro neto do coração, que em breve vai nascer, também longe, filho de uma amiga muito querida.
Para ela, todos eles estão juntos, muito perto, envolvidos pelo mesmo anel de fulgor.
quarta-feira, fevereiro 06, 2008
Coisas de criança 12
A menininha começou muito cedo a falar, espantando a todos com o seu domínio da linguagem. Um dia, não se sabe exatamente como nem quando, viu imagens de pingüins e ficou encantada com aqueles bichinhos. Como ainda não conhecia aqueles seres nem a palavra que os designava, exclamou:
- Kamimis! Kamimis! (ou camimes... como saber a grafia correta?)
A tia-madrinha achou muita graça e logo avisou à avó distante:
- Mãe, quando você vier, vai se encantar ao ouvir a palavra que a sua neta inventou para pingüins: kamimis!
A avó admirou-se, é claro. De onde saíra aquele inesperado neologismo? Quando enfim puderam conviver pessoalmente com a netinha, os avós confirmaram o quanto crescera o seu vocabulário. No entanto, percebendo a repercussão de sua criação lingüística, a menininha não mais repetiu kamimis. Apesar de aprender palavras difíceis (como helicóptero), tampouco fala pingüins, embora saiba perfeitamente de que se trata. Faz-se de rogada, com sorriso nos olhos, demonstrando entender que todos querem mesmo é ouvi-la.
Não importa. O fato é que kamimis já faz parte da memória afetiva familiar. Está presente inclusive nos ícones dos emocions trocados entre a avó, a madrinha, o pai da menininha e os amigos mais próximos.
Outra vez a viver deste lado do cais, longe da menininha, a avó espantou-se com a profusão de pingüins na passarela do Sambódromo do Rio de Janeiro. Neste ano, duas Grandes Escolas Samba do Grupo A, a Viradouro e a Unidos da Tijuca, apresentaram fantasias e carros alegóricos sobre o tema.
Não é difícil imaginar o pensamento da avó, enquanto assistia ao desfile pela TV:
- Oh! Kamimis! Certamente a menininha teria amado ver tantos kamimis a sambar na avenida!
- Kamimis! Kamimis! (ou camimes... como saber a grafia correta?)
A tia-madrinha achou muita graça e logo avisou à avó distante:
- Mãe, quando você vier, vai se encantar ao ouvir a palavra que a sua neta inventou para pingüins: kamimis!
A avó admirou-se, é claro. De onde saíra aquele inesperado neologismo? Quando enfim puderam conviver pessoalmente com a netinha, os avós confirmaram o quanto crescera o seu vocabulário. No entanto, percebendo a repercussão de sua criação lingüística, a menininha não mais repetiu kamimis. Apesar de aprender palavras difíceis (como helicóptero), tampouco fala pingüins, embora saiba perfeitamente de que se trata. Faz-se de rogada, com sorriso nos olhos, demonstrando entender que todos querem mesmo é ouvi-la.
Não importa. O fato é que kamimis já faz parte da memória afetiva familiar. Está presente inclusive nos ícones dos emocions trocados entre a avó, a madrinha, o pai da menininha e os amigos mais próximos.
Outra vez a viver deste lado do cais, longe da menininha, a avó espantou-se com a profusão de pingüins na passarela do Sambódromo do Rio de Janeiro. Neste ano, duas Grandes Escolas Samba do Grupo A, a Viradouro e a Unidos da Tijuca, apresentaram fantasias e carros alegóricos sobre o tema.
Não é difícil imaginar o pensamento da avó, enquanto assistia ao desfile pela TV:
- Oh! Kamimis! Certamente a menininha teria amado ver tantos kamimis a sambar na avenida!
segunda-feira, fevereiro 04, 2008
Fantasias da neta e da avó
Copacabana, Rio de Janeiro, Sábado de Carnaval no Calçadão da Avenida Atlântica. No chão e no ar, só confete e serpentina. Felizmente as ruas (e os transeuntes) estão livres daquele spray de espuma grudenta. Proibição ecologicamente correta.
Enquanto fazem a costumeira caminhada, a avó e o avô aproveitam para ver os blocos e foliões ao longo da avenida. A avó encanta-se com as fantasias das crianças pequenas: há odaliscas, fadas, bailarinas... Subitamente, não resiste e interrompe a caminhada, ao ver uma bebê que mal sabia andar, fantasiada de baianinha: saia curta com camadas de babados, colares leves e turbante. Muito fofa, brasileiríssima!
Pensando na netinha distante, a avó mentalmente começa a experimentar todos aqueles figurinos carnavalescos na sua menininha. De todos, o que lhe ficou melhor, sem dúvida, foi o último, o de baianinha. Imaginou-a maravilhada, correndo ao espelho para se ver, como na brincadeira em que enfia camisetas na cabeça, fingindo que são chapéus.
Foram tantas as fantasias que, quando a avó se deu conta, já completara a caminhada!
Enquanto fazem a costumeira caminhada, a avó e o avô aproveitam para ver os blocos e foliões ao longo da avenida. A avó encanta-se com as fantasias das crianças pequenas: há odaliscas, fadas, bailarinas... Subitamente, não resiste e interrompe a caminhada, ao ver uma bebê que mal sabia andar, fantasiada de baianinha: saia curta com camadas de babados, colares leves e turbante. Muito fofa, brasileiríssima!
Pensando na netinha distante, a avó mentalmente começa a experimentar todos aqueles figurinos carnavalescos na sua menininha. De todos, o que lhe ficou melhor, sem dúvida, foi o último, o de baianinha. Imaginou-a maravilhada, correndo ao espelho para se ver, como na brincadeira em que enfia camisetas na cabeça, fingindo que são chapéus.
Foram tantas as fantasias que, quando a avó se deu conta, já completara a caminhada!
domingo, fevereiro 03, 2008
Amor de Carnaval desaparece na fumaça...
Diz uma conhecida canção popular ("Máscara Negra" ) que amor de Carnaval dura pouco. É como fogo de artifício: brilha e desaparece na fumaça. Há, é claro, muitas histórias de amor que começaram no Carnaval e se mantêm até hoje. Mas há também muitas outras que acabaram na Quarta-feira de Cinzas, ou sequer chegaram lá...
Na minha mocidade, tive um amor de Carnaval, efêmero como o da canção de Zé Kéti. Talvez só tenha ficado na memória por ter sido o meu primeiro amor, experiência considerada significativa, numa época profundamente romântica (que desconhecia o atual ficar). Ou quem porque, quase imediatamente depois, eu encontraria o amor-de-toda-a-vida.
Conheci-o num baile carnavalesco de um clube altamente familiar (juro, havia esse tipo de associação). Estava com amigos numa mesa próxima. Trocamos olhares. Eu e as moças do grupo dele logo fizemos amizade e dançamos juntas. Estranhamente, ele não dançou com ninguém. Só mais tarde, através da mediação das amigas (eu estava sob vigilância familiar...), convidou-me para dançar. Encontramos-nos no meio do salão. Fluímos em par, a mão dele no meu ombro, a minha mão na cintura dele, empurrados pela multidão, no ritmo de marchinhas e sambas: Quanto riso, oh quanta alegria, mais de mil palhaços no salão!; Olha a cabeleira do Zezé, será que ele é , será que ele é!... O batuque era ensurdecedor e mal ouvíamos o que o outro dizia. Lembro-me de ele ter explicado que trabalhara de noite e por isso estava exausto. Nenhum de nós, por diferentes razões, poderia ficar até a banda tocar Cidade maravilhosa, sinal inequívoco de fim de baile. Pediu o número do meu telefone: eu não tinha (hoje, na era da popularização do celular, algo inconcebível...). Tentou obter uma Bic emprestada para escrever o dele, mas não conseguiu. Então rascunhou-o com palito de fósforo usado, creio que nas costas da própria caixa.
Não contarei as cenas dos próximos capítulos porque não valem a pena. O fato é que esse amor não manteve acesa a chama, nem reacendeu, como o fósforo apagado que servou de caneta. Já o amor pós-Carnaval, esse revelou-se Amor com A maiúsculo. Fulgurou e não morreu. A cada dia apura o sabor, como um bom vinho.
Na minha mocidade, tive um amor de Carnaval, efêmero como o da canção de Zé Kéti. Talvez só tenha ficado na memória por ter sido o meu primeiro amor, experiência considerada significativa, numa época profundamente romântica (que desconhecia o atual ficar). Ou quem porque, quase imediatamente depois, eu encontraria o amor-de-toda-a-vida.
Conheci-o num baile carnavalesco de um clube altamente familiar (juro, havia esse tipo de associação). Estava com amigos numa mesa próxima. Trocamos olhares. Eu e as moças do grupo dele logo fizemos amizade e dançamos juntas. Estranhamente, ele não dançou com ninguém. Só mais tarde, através da mediação das amigas (eu estava sob vigilância familiar...), convidou-me para dançar. Encontramos-nos no meio do salão. Fluímos em par, a mão dele no meu ombro, a minha mão na cintura dele, empurrados pela multidão, no ritmo de marchinhas e sambas: Quanto riso, oh quanta alegria, mais de mil palhaços no salão!; Olha a cabeleira do Zezé, será que ele é , será que ele é!... O batuque era ensurdecedor e mal ouvíamos o que o outro dizia. Lembro-me de ele ter explicado que trabalhara de noite e por isso estava exausto. Nenhum de nós, por diferentes razões, poderia ficar até a banda tocar Cidade maravilhosa, sinal inequívoco de fim de baile. Pediu o número do meu telefone: eu não tinha (hoje, na era da popularização do celular, algo inconcebível...). Tentou obter uma Bic emprestada para escrever o dele, mas não conseguiu. Então rascunhou-o com palito de fósforo usado, creio que nas costas da própria caixa.
Não contarei as cenas dos próximos capítulos porque não valem a pena. O fato é que esse amor não manteve acesa a chama, nem reacendeu, como o fósforo apagado que servou de caneta. Já o amor pós-Carnaval, esse revelou-se Amor com A maiúsculo. Fulgurou e não morreu. A cada dia apura o sabor, como um bom vinho.
A memória e as crianças
Adoro ler as memórias de infância da minha mãe. Fico exultante com esta preciosidade que é a junção da memória e da narrativa, uma espécie de máquina do tempo que me permite aceder a eventos que decorreram pelo menos duas décadas antes do meu nascimento.
Há dias uma amiga disse-me que andava encantada com o rápido crescimento dos filhos. Porque eles são crianças, dizia ela, muito pequeninas, e nós achamos que somos nós que registamos as suas recordações. E, depois, com três ou cinco aninhos, já nos deparamos com os meninos a dizer: "Mãe, lembra quando a gente comeu aquele doce? E daquela viagem que fizemos até àquele lugar?" Sim, já construíram o se próprio álbum de memórias.
Eu achei uma observação fantástica. Nunca tinha pensado nisso.
Há dias uma amiga disse-me que andava encantada com o rápido crescimento dos filhos. Porque eles são crianças, dizia ela, muito pequeninas, e nós achamos que somos nós que registamos as suas recordações. E, depois, com três ou cinco aninhos, já nos deparamos com os meninos a dizer: "Mãe, lembra quando a gente comeu aquele doce? E daquela viagem que fizemos até àquele lugar?" Sim, já construíram o se próprio álbum de memórias.
Eu achei uma observação fantástica. Nunca tinha pensado nisso.
sábado, fevereiro 02, 2008
Uma antiga história de Carnaval
A lembrança mais antiga que tenho do Carnaval ocorreu na minha meninice, no Alto da Boa Vista. Foi uma experiência de muito medo.
Algumas imagens fortemente impressas na memória aderem a relatos familiares, dando consistência e significado ao vivido. Na mais intensa delas, encontro-me escondida debaixo da cama, firmemente agarrada a um de seus pés. Nenhuma força humana conseguiria me tirar dali. Debalde tentaram me convencer que o motivo do pavor havia desaparecido: anda, não tenhas medo, podes sair daí, o mascarado já foi embora!
O mascarado a que se referiam era um homem fantasiado de gorila. Fantasiado não: para o eu-criança, ERA um gorila de verdade, com cabeça, mãos, pés, enfim, em tudo exatamente igual a um imenso, peludo e assustador gorila.
Não me lembro da cena em que o vi, só do efeito da visão. Soube que era costume na época os mascarados baterem às portas das casas, pedindo dinheiro. Quem sabe foi assim que me deparei de repente com ele. Tampouco sei a origem de tal medo. Talvez alguém, consciente ou inconscientemente, tivesse dito algo que me deixou predisposta a temê-lo. Curiosamente, lembro-me de ver passar, sem medo algum, carnavalescos com fantasias como a da caveira, hoje com certeza bem mais aterradora para a adulta que me tornei...
Lembro-me ainda que, passado algum tempo (não sei quanto, mas não deve ter sido pouco...), alguém me apontou (de longe, é claro...), já sem a máscara no rosto e sem as luvas-patas, o tal homem-gorila a lanchar na loja onde trabalhava o meu pai. Os meus olhos diziam que sim, que de fato pareciam humanos aquela boca a mastigar os alimentos e aquelas mãos que os levavam à boca. Contudo, havia TODO o resto da fantasia a lembrar-me que o monstro ainda estava ali. E então os olhos logo traíram a antiga e tênue certeza, fazendo o coração bater acelerado. Sobretudo quando avistaram, pousadas sobre o balcão, aquelas medonhas patas simiescas, cheias de garras.
Algumas imagens fortemente impressas na memória aderem a relatos familiares, dando consistência e significado ao vivido. Na mais intensa delas, encontro-me escondida debaixo da cama, firmemente agarrada a um de seus pés. Nenhuma força humana conseguiria me tirar dali. Debalde tentaram me convencer que o motivo do pavor havia desaparecido: anda, não tenhas medo, podes sair daí, o mascarado já foi embora!
O mascarado a que se referiam era um homem fantasiado de gorila. Fantasiado não: para o eu-criança, ERA um gorila de verdade, com cabeça, mãos, pés, enfim, em tudo exatamente igual a um imenso, peludo e assustador gorila.
Não me lembro da cena em que o vi, só do efeito da visão. Soube que era costume na época os mascarados baterem às portas das casas, pedindo dinheiro. Quem sabe foi assim que me deparei de repente com ele. Tampouco sei a origem de tal medo. Talvez alguém, consciente ou inconscientemente, tivesse dito algo que me deixou predisposta a temê-lo. Curiosamente, lembro-me de ver passar, sem medo algum, carnavalescos com fantasias como a da caveira, hoje com certeza bem mais aterradora para a adulta que me tornei...
Lembro-me ainda que, passado algum tempo (não sei quanto, mas não deve ter sido pouco...), alguém me apontou (de longe, é claro...), já sem a máscara no rosto e sem as luvas-patas, o tal homem-gorila a lanchar na loja onde trabalhava o meu pai. Os meus olhos diziam que sim, que de fato pareciam humanos aquela boca a mastigar os alimentos e aquelas mãos que os levavam à boca. Contudo, havia TODO o resto da fantasia a lembrar-me que o monstro ainda estava ali. E então os olhos logo traíram a antiga e tênue certeza, fazendo o coração bater acelerado. Sobretudo quando avistaram, pousadas sobre o balcão, aquelas medonhas patas simiescas, cheias de garras.
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