sexta-feira, maio 30, 2008

Hoje é dia de alegria

Hoje será um dia festivo.
O rosto do teu pai se iluminará
ao rever a azulíssima cor do teu olhar,
o rosto amado a desabrochar em sorrisos
e o balançar dos teus caracóis,
ao desceres célere os degraus da escada
e correres ansiosa ao encontro de seus braços.

quarta-feira, maio 28, 2008

Coisas de criança 21- da necessidade do convívio para a construção do afeto

Segunda visita do menininho ao apartamento da titia: desta vez, veio para ficar só com ela, sem a babá. Agora já reconhece a porta do apartamento onde a titia mora: é só virar para o outro do lado do corredor. Já pega o regador azul e ajuda a molhar as plantinhas. Já pára diante de alguns objetos e lembra dos comentários da titia, com palavras-síntese-de-histórias-ouvidas:

- kebou! (sobre o vaso de barro com tampa quebrada)

- sujo! (sobre a cadeira de repouso, que a titia correu a limpar quando o menino quis sentar)

- carro vermelho! (sobre a miniatura de carro que pertenceu ao filho da titia, hoje um homem, e que vai e vem, a cada encontro, como uma espécie de objeto transicional para chegadas e partidas)

- menino! (foto do filho da titia, primeiro dono do carrinho vermelho)

- Bia! (foto da menininha, filha do dono do carrinho, que não é a Beatriz, amiguinha da creche, mas deve se parecer muito com ela)

E assim ambos brincaram quase duas horas. Quando o titio chegou, amou a surpresa de encontrar aquela cena. Feliz, o menininho correu para os braços dele. Já sabia que ia ganhar balancinho. E deixou-se balançar, sem medo.

domingo, maio 25, 2008

Nota do Livro de Acalantos

Meu filho costumava adormecer ouvindo os sons de uma caixinha de música (a corda ia acabando, a música ficava cada vez mais lenta e os olhos dele iam fechando...). Essa caixinha de música ainda existe. Apesar de ter o vidro quebrado, ainda toca. Ele também gostava de cantar uma musiquinha só dele, uma espécie de hãn-hãn-hãn monocórdico, enquanto enrolava a fralda junto ao rosto, para adormecer a si mesmo. Quando começava a cantar e e enrolar o paninho, era sinal de que estava prestes a entregar-se ao soninho.
Para embalar a minha filha, lembro-me de que costumava cantar um trecho da canção “Menina”, de Paulinho Nogueira (música-tema dos personagens Índia Potira e Jerônimo, na novela Irmãos Coragem, de Janete Clair): “te carreguei no colo/ menina/cantei pra ti dormir/ te carreguei no colo/ menina/cantei pra ti dormir”. Para mim soava como cantiga de ninar, embora o resto da canção desmentisse isso, como mais tarde a minha filha percebeu, ao observar mais atentamente a letra.

homesick

Lembro-me da minha mãe a cantar "te carreguei no colo menina" e fico com homesick. Quem disse que saudade é uma palavra que só existe em português?

quinta-feira, maio 22, 2008

Feriado na Pracinha

Nasci num dia de Corpus Christi, em meados de junho, há muitos, muitos anos atrás ( não sei exatamente a que horas... creio que a minha mãe já me disse, mas, não sei porque, logo volto a esquecer...). Como é um feriado móvel, neste ano antecipou-se sensivelmente e caiu em maio.

Fiz de conta que hoje é meu aniversário e dei-me um presente: passei a manhã com meus netos do coração na pracinha do Bairro Peixoto.

Emociona-me profundamente saber que a mãe deles confia em mim e permite esta troca, este convívio afetivo, como se eu fosse de fato a avó (e, de certa maneira, sinto que sou).

A neta mais velha já fez oito anos. É tímida, alva, esguia, ruiva e com cabelos encaracolados. Lindíssima! Parece uma princesa das ilustrações dos livros de contos de fadas.

O caçulinha tem dois anos e meio. É um menino de cabelos castanhos e lisos, olhos vivos, levado, desinibido.

Contei à neta do coração que há 3o e tal anos atrás passeei ali com meus filhos. Vi aquelas árvores, hoje frondosas, quando ainda eram pequenos arbustos. Eu e a menina ruiva sentamos à sombra de uma delas e lemos juntas um livro de imagens (A menina e as borboletas, de Roberto Caldas). Brinquei com ela de jogo de letras, de adivinha-em-que-mão-está, etc. Ela desenhou na areia com gravetos. O menininho brincou com os carrinhos dele e com brinquedos de outras crianças. Depois ambos brincaram de descer juntos no escorrega.

Quando ele se distraiu um pouco a brincar no balanço com a babá (extremamente cuidadosa), despedi-me da neta mais velha e saí discretamente, para o menininho não chorar. Há muitas tarefas à minha espera em casa. Mas não faz mal se o trabalho no computador e outras atividades atrasarem umas horas: há uma outra qualidade do tempo que não quero adiar.

quarta-feira, maio 21, 2008

Guarda compartilhada

No Brasil, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto que inclui no Código Civil a opção de guarda compartilhada de filhos de pais separados. Embora na prática esta opção já existisse, o Código estabelecia apenas a guarda unilateral, na qual, em caso de separação, o filho ficaria com a mãe ou com o pai.
A proposta aprovada afirma que a guarda compartilhada poderá ser requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, por qualquer um deles, ou ser decretada pelo juiz. Claro que cada caso é um caso e, se não houver consenso, deve ser encaminhado para análise criteriosa, sempre pensando no que é melhor para o(s) filho(s). Neste último caso, por exemplo, caberá ao magistrado definir as atribuições específicas do pai e da mãe e os períodos de convivência do(s) filho(s) com cada um deles. A guarda compartilhada poderá ser modificada a qualquer momento, de modo a atender os interesses da criança.
Ao prever democraticamente várias possibilidades, esta inclusão procura acompanhar as atuais mudanças e reivindicações sociais, atentando, inclusive, para o redimensionamento da importância do papel paterno na educação dos filhos, posto em relação de equivalência com o papel materno.
Além de permitir aos filhos a oportunidade de conviver em igual período de tempo com o pai e com a mãe (e, por extensão, com as respectivas famílias, paterna e materna), dividindo igualitariamente direitos e responsabilidades, a guarda compartilhada, a princípio, poderá evitar que a(s) criança(s) seja(m) usada(s) como instrumento de poder e de barganha, com o intuito de atingir o ex-cônjuge, em prejuízo dos reais interesses do(s) filho(s), como por vezes sucede no caso da guarda unilateral.

terça-feira, maio 20, 2008

Marcas de amor

Leio o que escreves,
ouço o que recomendas,
penso em ti a toda a hora,
sobretudo em certos momentos
(quando lavo rúculas selvagens,
ou surpreendo no rosto do teu pai
traços que são teus).

Leio o que escreves,
ouço o que recomendas,
penso em ti a toda a hora,
sobretudo em certos momentos
(quando ouço Madredeus, Vitorino, Dulce,
ou surpreendo no jeito da tua filha
traços que são teus).

segunda-feira, maio 19, 2008

Coisas de criança 20 - Arco-íris

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O pai e a menina foram à festa de Matosinhos.  A menina adorou os carros, sempre dando gritos de alegria a cada passagem pelo pai.  Ao final da festa, estava tão cansada e feliz que pediu ao pai para ir às cavalitas, e lá foi até ao Metro a contar o que tinha feito e o que ainda queria fazer.  Quando chegaram em casa, como era de se prever, a menina dormiu logo, mas teve um sono agitado... tão agitado, que até rolou e o fez tantas vezes que até parou no chão.  Coitada, a menina chorou, o pai acordou preocupado, mas quando a deitou de volta à cama, já o choro havia parado, e a menina dormia novamente, continuando às voltas nos carros do sonho...

No dia seguinte, era tempo da menina voltar para a mãe.  O pai, triste, ainda preocupado com a queda da menina, olhou para o céu nublado e, no meio do sol e da chuva, viu um arco-íris, e sorriu.  As cores lembravam-lhe a menina nos carros da festa a andar às voltas.  A menina trouxera o arco-íris para o final de mais um fim-de-semana especial e o pai dormiu mais descansado.

sábado, maio 17, 2008

Uma visita especial

Ontem a avó e o avô receberam pela primeira vez em sua casa o menininho que mora ao lado. Este encontro, há muito desejado, foi preparado aos poucos, com cuidado e delicadeza. Afeto e confiança precisam de tempo para se fortalecerem. E enfim a hora chegou. Por isso foi algo especial, significativo.

O menininho veio com mochilinha da creche e chamou animado pela titia, antes mesmo de a porta se abrir. Com seu jeitinho curioso e ativo, percorreu com familiaridade todos os aposentos, como se sempre tivesse vivido ali. Depois, deteve-se diante da fresta da varanda, percebendo-se do lado de cá, a espiar para a sua casa, do lado de lá.

Desenharam, fizeram barcos de papel, tiraram fotos e viram a lua.

Quando o menininho retornou à casa, correu para chamar a titia. Agora, do lado de cá e do lado de lá, a fresta tem um novo sentido. Doce, como fruta madura.

sexta-feira, maio 16, 2008

A avó e os netos do coração 2

A avó tem um coração cheio de recantos, talvez "mais vasto que o mundo" (Drummond). Em cada um desses recantos mora uma criança especial, muito amada. Há as crianças que já cresceram e que hoje até já são pais de outras crianças, mas, para a dona do tal coração, ainda são (sempre serão) "eternos infantes", como diria Pessoa.

Nessas muitas moradas afetivas, há o infante João, recém-nascido, o neto do coração de Portugal, a quem ela dedicou um acalanto, embalando-o docemente em pensamento. Há o menininho que mora no Brasil, no apartamento ao lado, e que tem quase a mesma idade da menininha, "a neta primeira a chegar", em Portugal.

A avó sente não poder conviver com eles ao mesmo tempo. Sabe que quando está com o neto de cá não pode estar com os do outro lado do cais. E vice-versa. Mas sabe também que amar um é amar os outros, pois este é o milagre da multiplicação do amor. Quanto mais se ama, mais se acrescenta.

quinta-feira, maio 15, 2008

A fresta, a festa ou Doces convívios com o neto do coração

A cada dia aprofunda-se mais e mais a relação afetiva da avó com o netinho do coração (o menininho que mora no apartamento vizinho).

Ambos já têm um conjunto de vivências em comum que permitem pequenos diálogos e brincadeiras. E a avó maravilha-se por poder acompanhar de perto o crescimento em linguagem e em beleza deste pequenino ser.

Quando o menininho chega da creche, corre à varanda, sôfrego, já com saudade dos brinquedos que deixou. Primero, distrai-se a brincar com eles. Depois, chama a titia (a avó do coração) e pede-lhe para sentar na soleira, próximo à fresta da varanda. Mesmo que não estejam a trocar brinquedinhos, gosta de saber que ela está ali a vê-lo brincar, através do reflexo do vidro espelhado.

À noite, após o jantar, reencontram-se novamente. Imitam vozes de animais, falam da lua que aparece (e desaparece) no céu, dos novos brinquedos, dos amigos preferidos, etc.

Aos poucos o espaço de interação alarga-se e cresce junto com o menininho. Já ganhou o corredor do edifício (de vez em quando a avó consegue se despedir do menininho de manhã, quando ele vai para a creche) e houve até um breve encontro na pracinha, em meio a escorregas, trepa-trepas e balanços, com direito a braços estendidos do menininho para acolher os avós do coração.

Amanhã, decerto, haverá mais histórias para contar. Que alegria é viver e, sobre todas as coisas, amar!

quarta-feira, maio 14, 2008

Ontem, dia 13 de Maio

Ontem, no dia 13 de Maio, comemorou-se no Brasil o Dia da Libertação dos Escravos. Estima-se que mais de 4 milhões de negros africanos foram trazidos à força para trabalhar nas plantações e servir aos seus senhores ociosos.

Não há o que comemorar. Não podemos apagar esta aviltante página da nossa história passada. Mas convém lembrar, sempre, para não esquecer. Convém lembrar para não esquecer que ainda há trabalho escravo aviltando as páginas que se escrevem na nossa história presente.

"Deus! Ó Deus! Onde estás que não respondes?" (Castro Alves, Vozes d'África). Onde estão, hoje, as vozes levantadas? Onde estão os gritos pelos direitos humanos? Convém denunciar e clamar e agir.

segunda-feira, maio 12, 2008

Na mesinha, um vaso de begônias...

Ontem recebi do meu amor um grande abraço, daqueles tão significativos, que dispensam palavras. Mas elas vieram, sinceras, intensas, acompanhando um vaso de begônias:

- Obrigado por seres a mãe dos meus filhos.

Não, não repeti o lugar-comum:

- Não precisava...

Precisava sim. Cada vez mais precisamos manifestar e aceitar afetos, bem-quereres. Acolhi o abraço, as palavras e as flores.

Olho o vaso de begônias, abro as cortinas, há sol lá fora. Respiro fundo, penso afetuosamente nos meus amores, começo com novo alento um novo dia.

domingo, maio 11, 2008

No Dia das Mães

(Para todas as mães, em especial para aquelas cujos filhos já partiram)

“Quando eu morrer, filhinho,
seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
e leva-me para dentro da tua casa.
Despe-me o ser cansado e humano
e deita-me na tua cama.
E conta-me histórias caso eu acorde,
para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
até que nasça qualquer dia
que tu sabes qual é.”

fragmento do Poema VIII de O Guardador de Rebanhos, de Alberto Caeiro (heterônimmo de Fernando Pessoa)

quinta-feira, maio 08, 2008

Carta-acalanto para a mãe de Isabella

Querida Ana Carolina de Oliveira,

Você não me conhece pessoalmente. Sou mãe, avó, educadora, cidadã (e, atualmente, alguém que se esforça para tornar-se um ser humano melhor e sonha construir um mundo em que o amor seja cada vez mais possível). E, como tal, queria manifestar - a você, a seus pais e a toda a sua família - a minha imensa solidariedade. Imagino que devem estar recebendo o apoio e o afeto de milhares de pessoas do Brasil e do mundo. Mas carinho nunca é demais.

Procuro mas não encontro as palavras certas para confortá-la. Não há na língua portuguesa nenhuma palavra para nomear a dor inimaginável de quem perdeu um filho, especialmente uma criança.

Queria dizer-lhe apenas, nesta carta-acalanto, que ao solidarizar-me com você, procuro também serenizar um pouco o meu coração e apaziguar a dor deste luto. Que sempre a acompanhe a certeza de que soube amar e cuidar bem da sua pequena, a certeza de que soube dar a ela muito amor e foi por ela plenamente correspondida. Guarde esta linda imagem de amor materno e filial. Certamente ela a ajudará a atravessar melhor este momento e os que ainda virão. Acolha também a convicção, forjada no ideal de justiça, de que, no que depender de profissionais sérios e competentes e da sociedade em geral, "Isabella não será esquecida".

quarta-feira, maio 07, 2008

Coisas de criança 19 - Amizade

Há uma nova música no Canal Panda que o pai e a menina adoram.  Fala sobre a amizade e o refrão é como se segue:

 

Quando estamos tristes

Quem nos ouve, quem lá está

Melhor que ter amigos não há

Quando temos festa

Quem alegra, quem lá está

Melhor que ter amigos não há

 

A letra, melodia e colorido da imagem cativaram-lhes ao ponto de cantarem juntos.

- Canta de novo papá!

terça-feira, maio 06, 2008

Coisas de criança 18 - A menininha, o tempo e a distância

Como uma criança ainda muito pequena consegue entender noções tão abstratas para ela, como a imensa distância entre os países, onde residem seus familiares paternos mais próximos (os avós, a tia-madrinha), ou a extensão do tempo que falta para que ela, que vive num país de clima frio, possa desfrutar novamente as delícias do Verão?

Maravilho-me com algo aparentemente comum a todas as crianças. Mas o fato é que a menininha, com apenas dois anos de existência, não esquece que nas férias passadas (entenderá lá o que são férias?) tomou banho de piscininha na casa da bivó paterna. Assim, neste último fim-de-semana com o pai, foi à gaveta pegar o biquini e pediu a ele que a levasse lá.

E quando interagia pela webcam com os avós paternos ("os avós do avião", como ela a eles se refere, em conversa com a tia-madrinha), de repente pediu para falar com a madrinha. O pai tentou fazê-la entender que a madrinha estava sem computador em casa e por isso não poderia vê-la.

Deve ter entendido, pois logo voltou a gargalhar gostosamente com alguns ícones animados, especialmente o do sapo que fisga com a língua uma mosca e logo solta um arroto (não é socialmente bem-educado, sabemos bem disso, mas é inegável que as crianças apreciam com naturalidade coisas escatológicas, como arrotar e soltar "pum").

- Mais! O do sapinho.

sábado, maio 03, 2008

Quem ama

não espera ser amado, apenas ama

espera o tempo que for preciso, mesmo que não tenha tempo

vai até onde for preciso, mesmo que não haja caminho

porque quem ama cria o tempo e o caminho

quem ama simplesmete ama

sem condições, sem marcações, sem lista de desejos,

sem variações, sem divisões, sem paixões de uma só noite

quem ama simplesmente

segue seu caminho e o seu tempo,

o caminho que cruza com o do que é amado,

no mesmo tempo do que é amado,

mesmo que o que é não seja um ser,

talvez uma planta, ou um gato, ou um livro, ou um lápis

quem ama por vezes nem sabe que ama

apenas ama

ama apenas

e o que sente não passa, fica, permanece,

ontem amamos, hoje amamos, amanhã também

com intensidade, mas sem sufocar

com ardência, mas sem picada

com calor, mas com ar, água e terra,

com alimento

Alguns versos e pensamentos I

"Não cuidarei dos rosais
que ele deixou, nem dos pombos,
que eles sequem, como eu seco,
que eles morram, como eu morro"

Rosalía de Castro

Espécie de cantiga de amigo do nosso tempo. Canto da ausência do ser amado. Cansada de esperar em vão, seca de afetos, a mulher rebela-se e decide não mais cuidar das coisas que ele deixou e que a fazem lembrar dele.
Obs.: Inicio nova série de postagens, com fragmentos de versos e pensamentos que, por diversas razões, me tocam.