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Uma vez me disseram que aqueles que têm um dom raramente o manisfestam. Por outras palavras, as pessoas mais preciosas que já encontrei não trazem um letreiro a indicar isso. Então acontece nas relações humanas aquilo a que chamo "efeito-violeta": estão ali, num canto, com as suas folhas aveludadas e as suas florinhas perfeitas. Se frequentarmos muito uma casa com violetas, não conceberemos mais os parapeitos sem os pequenos vasos. Mas se estivermos lá, no meio de uma festa relâmpago e ruidosa, provavelmente nunca diremos: a casa tinha violetas.
Isto tudo é para dizer que o fotógrafo brasileiro Evandro Teixeira é uma violeta.
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Sabe como poucos interpretar a realidade brasileira. Trabalha com gosto, trata grandes repórteres e estagiários com a mesma simplicidade. Tem mais energia do que alguns colegas vinte anos mais novos do que ele. O Jornal do Brasil teve a horna de tê-lo na sua equipa. Carlos Drummond de Andrade dedicou-lhe um poema, texto que considero o elogio máximo do fazer fotojornalístico.
"Diante das fotos de Evandro Teixeira
A pessoa, o lugar, o objecto
estão expostos e escondidos
ao mesmo tempo sob a luz,
e dois olhos não são bastantes
para captar o que se oculta
no rápido florir de um gesto.
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É preciso que a lente mágica
enriqueça a visão humana
e do real de cada coisa
um mais seco real extraia
para que penetremos fundo
no puro enigma das figuras.
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Fotografia - é o codinome
da mais aguda percepção
que a nós mesmos nos vai mostrando
e da evanescência de tudo
edifica uma permanência,
cristal do tempo no papel.
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Das lutas de rua no Rio
em 68, que nos resta
mais positivo, mais queimante
do que as fotos acusadoras, tão vivas hoje como então,
a lembrar como a exorcizar?
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Marcas da enchente e do despejo,
cadáver insepultável,
o colchão atirado ao vento,
a lodosa, podre favela,
o mendigo de Nova Iorque
a moça em flor no Jóquei Clube,
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Garrincha e Nureiev, dança
de dois destinos, mães-de-santo
na praia-templo de Ipanema,
a dama estranha de Ouro Preto,
a dor da América Latina,
mitos não são, pois que são fotos.
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Fotografia: arma de amor,
de justiça e conhecimento,
pelas sete partes do mundo
a viajar, a surpreender
a tormentosa vida do homem
e a esperança de brotar das cinzas.
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